terça-feira, outubro 14, 2008

Eu II (Poema Sibilado)

Contemplo meu corpo nu:
não sou forte,
não sou fraco.
Não sou gordo,
tampouco magro.
Nem belo, nem feio.
No espelho,
o que vejo
é ordinário,
é vulgar.
Em cada esquina
um outro ser
que poderia ser eu.


Eu sei tanto
de toda vã teoria.
Só não sei o servir
de todo esse saber.
Se sou só um simples
sujeito comum,
sujeito às vicissitudes
como todo o resto.


Eu canto e toco
um tanto desafinado.
Também desenho,
nada rebuscado.
E rabisco
poesias.
Junto palavras soltas,
o que é fácil:
para ser poeta,
não precisa de rima,
nem de palavra certa,
nem de obra-prima.


Pra fazer poesia
contemplo o vento,
vomito melancolia,
pranto e lamento.
Também sou fingido:
falseio felicidade.
Um sorriso polido
gotas de falsidade.

Timidez

Eu sou o fogo
que não sabe arder
a água insalobra
a promessa de chuva
o botão da flor
no Inverno.

Meu amor
é o amor
das cartas de amor
esquecidas na gaveta.
É a foto
não revelada.
A promessa não cumprida.

O que eu quero
é segredo
é um olhar de cobiça
misto de medo e preguiça:
é inércia.

Roubar teus beijos,
tomar teu fôlego.
Imaginar é sofrer
a dor de quem não sabe
se vai ou se fica.

Por isso escrevo,
inútil dizer escrito
do que deve ser dito,
bradado:
te desejo,
e mais nada.

Tímido adj 1. Que tem temor. 2. Que tem dificuldade de relacionar-se com outrem; acanhado, bisonho, retraído. 3. Próprio de tímido. 4. Fraco, frouxo.

Mnemosène

*Para minha amiga Michelle
A vida passa.
O mundo gira.
Tudo muda.
Pouco fica.
Da história que tivemos
tudo escrito
a ferro e fogo
na breve memória.
Mas o tempo
algoz faminto
e o esquecimento.
Tanto que já pressinto
o rio dos anos escoando:
como ampulheta,
areia fina entre meus dedos.
Ainda assim não foi levado
o que me restou de ti:
teu sorriso indelével.
Tua voz ecoa
ainda quando escoa
o lago das eras.
Caminhos bifurcados,
e o tanto que se perdeu.
Naquelas manhãs frescas
de minha juventude:
todo o companheirismo,
meu jeito estranho,
meu amor platônico!!!
As rosas dos teus
dezessete anos; cartões.
Rosas essas que foram botões
desabrochando apenas
para aquele momento:
esquecidas no tempo.
Outros Outubros vieram.
Outros muitos virão.
Sinto tua falta, amiga,
como os velhos sentem
saudades da infância
(hoje eu sou um velho)
a estranha ânsia
de voltar a história.
A tua fé,
a tua força,
é o melhor que tens.
E esse teu coração lindo,
que não conheça a amargura.
Os teus sonhos,
os teus medos,
teus anseios,
não mais os conheço.
O que não esqueço
é que és um anjo
linda de uma maneira
que outros não podem ser.
De mim não quero que lembres
quase nada,
já sabes o que sou.
Se posso, se permites,
peço tão somente,
que na tua solidão,
me inclua em tuas preces.
Quando é um anjo que pede
o céu se compadece.

segunda-feira, outubro 13, 2008

Vaga-Lumes

*Para RSS
Eu
que quase nunca a vejo
não deveria deitar palavras
de conselho.
Não deveria escrever nada,
tampouco,
elogiar os olhos dela
que puseram um raro azul
na minha rosa amarela.
Até tua confusão
é bela.
O seu desconhecer
sobre os caminhos espinhosos
do amor, da vida, da solidão
é também o meu desconhecer.
Um anjo de toda luz radiante
não deveria provar do sofrimento.
Mas não és boneca,
não tens o sorriso
emoldurado em porcelana.
Ainda prefiro que sejas feliz:
teu sorriso é fonte fresca.
Quando sorris
quase me esqueço
de toda a tristeza.
Quando sorris empalidece
a beleza
que não a tua.
Acentua
a tua luz
que não há outra igual.
Nem parecida.
Se eu fosse alguém
eu deitaria a luz do céu
os faróis
e os postes.
As algas luminosas,
os letreiros,
todo o fogo e toda luz.
Nesse negrume
só haveria os olhos teus
e os vaga-lumes.

Orvalho

Diga-me: quem colhe teu orvalho
nas manhãs mais felizes;
quem cala teus rancores
em corpos unidos como água e sal
num mar revolto.
Mostra-me a que vens
na velada noite de sepulcro pálido.
Sei que vens rasgar minha pele
com olhar pétreo,
mas não conheço, entretanto,
as razões de seu intento.
Mata-me, nessa tenra eternidade
de querer, sofrer e perder.
O instante de agonia é infinito
e tudo que tenho é a infinidade
de sofrimentos férreos.
Dá-me um quarto de um beijo
que seria rara cada estrela;
mas já por esmola tenho
a parte que a mim coube
na partilha de nosso amor:
recordações e nada mais.

Dialética Maldita

Não sei se é cansaço ou solidão
a nódoa em meu travesseiro.
Quando me deito
sempre sinto os fantasmas
daqueles que não amei.
De todos que se foram
os rostos desbotados
nos salões da memória.
Os eternos "e se"?
As natimortas possibilidades
de ser feliz.
Aqueles que eu esqueci
também me assombram
seus rostos, seus nomes,
suas vidas.
Aqueles que me traíram
aqueles que eu enganei.
Todos estão aqui.
Pedindo perdão.
Pedindo arrependimento.
Nada volta
dialética maldita do tempo.
Quase nada chama
em mim arrependimento.
Eu só me lamento
e sempre lamentarei
o beijo que não te dei
ontem.

Quadros

A minha casa é pequena
para tantas lembranças.
Nesse aperto me encolho
e as lembraças crescem.
Quando entro em casa
e dispo os sapatos
o presente, porta afora.
Porta adentro o passado.
Teu rosto me assombra
na sombra das paredes
quadros invisíveis teus
sussurram teu nome.
Três sofás velhos gastos
e um sino-dos-ventos
sabem que em vão invento
maneiras de te olvidar.
Esta é minha casa
meu lar sempre foi
o que restou de ti:
lembranças.

Tenho Asas

Há tanto tempo
que te foste
que trago a tristeza
cristalizada.
Há muito tempo
havoa tempo
de lamentos
lamuriantes.
A vida é curta
mero pestanejar
ainda houve tempo
de te amar.
Mas um dia
estou sozinho
tenho asas
não tenho ninho.

Grito

Eu quero gritar
a minha perda.
Tê-la espalhada
nos recantos do mundo,
nos quadros-negros das escolas,
nas avenidas, mansões.
Praias e desertos
se encherão com meu alarde.
E nos largos das ruas
e nas mesas dos bares
nos bordéis,
ônibus de viajantes
distantes de casa,
nas praças interioranas
afixaraão-se cartazes.
Nas notas de troco,
talões de cheque,
bilhetes de cinema,
maços de cigarro,
haverá uma mensagem.
Que a minha tristeza
caia com a noite
envolvendo o mundo
nesta mortalha de pesar.
Que a minha dor
fulgure com o Sol
gerando flores
e animais pestilentos.
Que o sal dos meus olhos
sature toda a água,
todo o chá, todaa carne
e a pele de todas as amadas.
Nas calçadas
de aglutinadas multidões
nas casas todas
todos saberão
que te perdi.

Pesares

Tenho vastas lágrimas,
infindas lástimas,
e nos meus olhos
tenho restoios.
Trago pesares diversos,
duros mares desertos;
por trás de óculos opacos
o odor do tabaco.

Poeta Vagabundo

Tudo que ouço
torno em poesia
e a poesia minha
é só melancolia.
O que eu guardo
a penas duras
é o teu adeus:
suaves torturas.

"Gosto de escrever poesias
porque outros poetas vão lê-las
e apreciá-las".